Gritomudo

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quarta-feira, 3 de outubro de 2012

UMA HISTÓRIA PROJETIVA

 
- Por John Blofeld* -
 
Certa vez, um jovem e brilhante sábio, cognominado Li, saiu de casa seguindo um impulso repentino de se tornar discípulo de um mestre famoso.
Recebendo-o, algo surpreso, em seu retiro na montanha, o mestre perguntou:
"Meu jovem senhor, o que este humilde homem pode ensinar a um cavalheiro erudito como o senhor?"
Prostrando-se precipitadamente aos pés do mestre, Li exclamou:
"Eu estudei os Quatro Livros e os Cinco Clássicos (do Confucionismo Estatal), do começo ao fim sem descobrir uma única coisa que me leve ao caminho da imortalidade".
"Mas, por que você deseja tornar-se imortal?", replicou o mestre. Eu nunca ouvi falar em imortais que ocupem altos cargos no Governo do Império, enquanto que um especialista em Confucionismo como você pode tornar-se Ministro do Estado."
Não obstante, a sinceridade óbvia do jovem venceu e o mestre concordou em ensiná-lo. Dentro de poucos meses, Li ficou perito nas práticas iogues e saía com facilidade de seu corpo** para visitar os palácios de nuvens dos imortais - ou dirigia o seu voo circulando em torno do sol e da lua.
"Acredito que estou em vias de superar o mestre", refletiu. "Estou quase me tornando imortal. Ah, que êxtase saber como voar sem asas!"
Estimulado por esse pensamento, ele sugeriu ao mestre uma competição.
"Sem levantar-nos da esteira de meditação, cada um de nós deverá voar até a residência dos imortais, na montanha Kun Lung (longínqua, na Ásia Central), colher um dos pêssegos da longevidade e voltar tão rápido quanto possível. Quem chegar primeiro com uma dessas raras frutas deverá ter o prazer de oferecer ao outro um banquete ao luar."
"Bem", respondeu o mestre, sorrindo. "Vamos até nossas celas e comecemos imediatamente."
É desnecessário dizer que o velho senhor tão logo cruzou as pernas na postura de meditação e já estava longe na montanha Kun Lung, retornando com um pêssego aromático nas mãos. Horas mais tarde, foi verificar se o espírito de Li ainda estava ausente de seu corpo e encontrou o infeliz sábio próximo das lágrimas. Pois, com o esforço que fez, seu espírito recusou-se obstinadamente a ir sequer até o teto da cela.
"Meu poder abandonou-me", ele gritou.
"De modo algum", replicou o mestre. "Foi o poder do Tao*** que o abandonou, pois você atribuiu a si mesmo a obra maravilhosa d’Ele. Agora você terá que recomeçar desde o princípio."
A moral desta alegoria é a de que os adeptos, por mais que recebam de bom grado as maravilhosas experiências que às vezes os visitam, não devem vangloriar-se de nenhuma realização pessoal, porque apenas num sentido muito superficial essa façanha pode ser chamada de pessoal.
 
(Texto extraído do livro "O Portal da Sabedoria" – Editora Pensamento.)
 
*#ficadica#
Obrigada, Fê!!! Bjks de luz!

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