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quarta-feira, 18 de dezembro de 2013

Solução de um filósofo contra o fracasso do casamento: “amor suave”

(...) amor ideal é uma divindade que traz sofrimento

“Por que ele [o amor ideal] parece tão difícil de ser vivido nos dias de hoje?”, pergunta-se Bruckner, para responder em seguida: “Porque o veneramos como a uma divindade, por ter se tornado, assim como a felicidade, o alfa e o ômega das sociedades ocidentais”. (Em outro livro, publicado no Brasil como A euforia perpétua, Bruckner analisa e questiona o que chama “dever de felicidade”, a crítica ao culto e à obrigação de ser feliz como marca do Ocidente).

O filósofo acha que as pessoas hoje se imaginam infelizes por não serem felizes ou se preocupam por nunca protagonizar uma grande paixão. Para quem pensa assim, a paixão que não é louca não merece ser vivida. Confunde-se o amor e casamento, flexibilizando o primeiro e domesticando o último. Resultado: casamos menos e nos divorciamos mais. O que deveria gerar mais felicidade causa também aflição. “O amor triunfou no casamento antes de destruí-lo por dentro”, escreve Bruckner.

Para ele, a forma contemporânea do casamento combateu o modelo clássico que impunha às mulheres a infelicidade e a humilhação protagonizada por maridos despóticos, mas criou outros fragelos, sem se livrar dos antigos. Estabeleceu uma espécie de “tudo ou nada”: a busca de conciliar tudo, o sentimento e o erotismo, a educação das crianças e o êxito social, a efervescência e a permanência. (Sobre essa cruel exigência imposta aos casais, leia a instrutiva entrevista do psicanalista Contardo Calligaris ao iG).

“Os casais de hoje não morrem por egoísmo ou materialismo, morrem por um heroísmo fatal, uma ideia ampla demais de si mesmos”, escreve Bruckner. “Cada mulher se sente obrigada a ser, ao mesmo tempo mãe, puta, amiga e ‘ter atitude’; cada homem, pai, amante, marido e vencedor: pobre de quem não preencher essas condições”.

Amar demais é platonismo demente

Como numa filosofia de guerrilha, Bruckner chama de “platonismo demente” aqueles que amam o amor em demasia; para ele, significa amar mais o amor do que amar as pessoas propriamente. A vida de um casal, segundo o filósofo, tornou-se mais difícil desde que, de todas as suas funções, guardou-se apenas a da satisfação plena. “Por querer dar certo a qualquer preço, o casal se consome em ansiedades, teme a lei da entropia, a aridez das horas mortas. A menor queda de tensão é vivenciada como um fiasco, um descumprimento da promessa”.

Em síntese, espera-se volúpia demais no casamento, diz ele. Na acepção idealizada, o amor permanece como um fetiche inviolável, um tipo de liberdade forçada. Em resposta ao amor-paixão, mais breve e fugidio, Pascal Bruckner propõe procurar a felicidade possível a partir de uma coexistência harmoniosa. No lugar de êxtases estrondosos, regularidade e entusiasmo. Diante da possibilidade de exuberância e arrebatamento, opte-se pela indulgência e delicadeza, equilíbrio e ponderação.

Não pergunte sobre o amor para não sofrer ao amar

Convém prudência ler este feroz ataque ao amor, mesmo ao amor idealizado. Como qualquer debate em torno de temas complexos, deve-se ler com cautela as pregações de Bruckner. Ele não admite, mas é o que se pode chamar de um estoico. Os gregos antigos adeptos do estoicismo pregavam a virtude como algo suficiente para a felicidade; um sábio era imune aos infortúnios e ao sofrimento. A racionalidade, a harmonia e a indiferença seriam marcas de uma vida serena e, portanto, sábia e feliz. Sem escravizar-se pelas emoções e pelas paixões – em geral destrutivas, alertavam.

Houve muitos estoicos na história das ideias, mas não necessariamente tiveram razão. O que é a felicidade para eles? É não perguntar em que consiste a felicidade, porque existe na interrogação o princípio da infelicidade (John Stuart Mill). O que é a riqueza? É não desejar mais do que aquilo que se tem, conselho central dos clássicos, de Epicuro a Platão. O contrário não é apenas uma causa de infelicidade; a ambição desmedida da acumulação material é, como Baudelaire avisa, a raiz da vulgaridade.

No caso de Pascal Bruckner e seu livro sobre o fracasso do casamento por amor, o diagnóstico parece correto – todos se queixam de não conseguir satisfazer-se amorosamente apesar de o amor ser colocado “no topo da expectativa”. Mas recorro a duas outras citações para aplacar a intensidade da crítica de Bruckner (em seu diálogo O crítico como artista, Oscar Wilde – ele de novo – afirmava que para dizermos aquilo em que verdadeiramente acreditamos é preciso falar através de lábios alheios).

De José Miguel Wisnik, num ensaio publicado no livro O sentido das paixões, organizado há mais de 20 anos por Adauto Novaes, veio a pergunta: “É permitido dizer que o mundo é pobre para quem jamais foi doente o bastante para a paixão?”. E do psicanalista Jurandir Freire Costa, em seu livro Sem fraude nem favor: estudos sobre o amor romântico, surgiu a instigante ideia: “Sem amor estamos amputados de nossa melhor parte. A vida pode até ser mais tranquila e livre de dores quando não amamos. Mas trata-se de uma paz de cinzas”.

Eis um bom motivo para retomar o tema. Em outro artigo. 
NA ÍNTEGRA: 
http://pensata.ig.com.br/index.php/2013/12/17/solucao-de-um-filosofo-contra-o-fracasso-do-casamento-amor-suave/

Ps: Adoro o Contardo!!!

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