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quinta-feira, 16 de junho de 2011

Percorrendo a Espanha como na Idade Média


Descubra tudo o que você precisa saber para percorrer o caminho mais místico do mundo e, de quebra, garantir seu pedaço no céu

Mônica Cardoso, especial para o iG São Paulo


Pausa na caminhada para contemplar as montanhas da região do Cebreiro

O Caminho de Santiago percorre a Espanha de ponta a ponta. São quilômetros e quilômetros de paisagens deslumbrantes e cheias de história. Um dia de caminhada nunca é igual ao outro.

De planícies desérticas a montanhas geladas. De simples capelas a majestosas catedrais. De vilarejos bucólicos aos edifícios modernosos das grandes cidades. E ainda castelos, ruínas de antigas cidades medievais, um sem número de igrejas e muitas, muitas estátuas de Santiago, como simples peregrino ou um exterminador de mouros. 



Veja as atrações escondidas pelo Caminho Francês

Quem trilhar o Caminho ainda este ano pode ser perdoado de todos os pecados, segundo a tradição católica de mais de oito séculos. E de quebra, receber bênçãos especiais. O Ano Santo ou Jubilar ocorre quando o dia 25 de julho, data do martírio de São Tiago, cai em um domingo. Durante o ano inteiro, a Porta Santa da Catedral, em Santiago de Compostela, permanece aberta.

Para receber o Jubileu, são necessários três requisitos ao final da peregrinação: visitar o sepulcro do santo, rezar uma prece no local e fazer a confissão e comunhão. Quase 300 mil pessoas, das mais variadas partes do mundo, já realizaram o percurso neste ano, um recorde. Aproveite que ainda dá tempo. O próximo Ano Jubilar será apenas em 2021.

Credencial
Getty Images
A credencial carimbada dá direito ao diploma de que trilhou o Caminho

Com a credencial, o peregrino pode pernoitar gratuitamente em albergues e monastérios ao longo da rota. Também é possível se hospedar em locais pagos, como albergues privados, campings, hostels e até hotéis super luxuosos. Há opções para todos os bolsos e estilos de peregrino. 

Uma dica: o documento diminui a chance de ser deportado na Espanha, o que tem se tornado corriqueiro com os turistas que chegam ao país.

Em cada hospedaria, apresente a credencial, que será carimbada com os chamados “sellos”, uma prova de que está percorrendo o Caminho. Ao terminar o trajeto, basta ir até a Oficina de Peregrinos e mostrar a credencial para receber a Compostela, um belo diploma escrito em latim - e com o nome do peregrino também em latim - igualzinho aos concedidos na Idade Média.

Percorrer pelo menos os últimos 100 quilômetros do trajeto a pé ou 200 quilômetros de bicicleta já garantem o diploma. Porém, o maior desafio é encarar o percurso inteiro. O mais tradicional, o Caminho Francês, tem cerca de 800 quilômetros (saiba mais em Os vários Caminhos de Santiago).

A Oficina de Peregrinos fica ao lado da Catedral, na Rua do Vilar, número 1. O escritório está aberto diariamente das 10h às 20h. Já a credencial pode ser obtida em qualquer associação de peregrinos do mundo. Em São Paulo, a Associação de Confrades e Amigos do Caminho de Santiago de Compostela (ACACS-SP), concede o documento gratuitamente. Se você mora em outra cidade, é cobrada apenas a taxa de Sedex.


Divulgação
Depois de centenas de quilômetros, a visão da Catedral de Compostela

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Os vários Caminhos de Santiago

Você pode cruzar a Espanha de norte a sul, de leste a oeste ou pelo litoral. Também pode incluir Portugal no roteiro. Conheça as principais rotas que levam até Santiago de Compostela

Mônica Cardoso, especial para o iG São Paulo

O Caminho de Santiago é um e ao mesmo tempo são vários. Cada rota guarda surpresas aos peregrinos, que costumam dizer que o percurso começa na porta de casa, onde quer que seja.

E o ritual é o mesmo, desde a Idade Média: chegar à Praça do Obradoiro onde fica a bela catedral, abraçar a estátua do santo e fazer uma oração em seu túmulo. Escolha o seu caminho e pé na estrada.

Caminho Francês

Planícies douradas da região de Léon

A rota francesa é o trajeto preferido pelos peregrinos. Para ela, confluem diversas rotas provenientes do restante da Europa. São cerca de 800 quilômetros, atravessando o nordeste da Espanha. Ele oferece a melhor infraestrutura, com bom número de opção de hospedagens.

Não há um ponto de partida definido, mas a maioria dos andarilhos sai do povoado francês de Saint-Jean-Pied-de-Port, bem na fronteira entre França e Espanha. Em seguida, o percurso entra no território espanhol pelo vilarejo de Roncesvalles, com apenas 30 habitantes, e continua em direção oeste até Santiago de Compostela.

Logo no primeiro dia do trajeto, o trecho de 23 quilômetros entre Saint-Jean-Pied-de-Port e Roncesvalles exige bastante do peregrino. Será preciso cruzar os Pirineus, com subidas íngremes e descidas abruptas. Por esse motivo, muitos preferem iniciar o percurso em Roncesvalles, já do lado espanhol.

Seja qual for a opção, siga a antiga tradição medieval e participe da missasolene que acontece diariamente às 20 horas na igreja da Real Collegiata de Roncesvalles. Erguido no século 12 como um dos primeiros hospitais aos viajantes, o conjunto inclui uma igreja, onde vivem menos de dez religiosos, e um refúgio exclusivo aos peregrinos.

A rota francesa leva pouco mais de um mês para ser concluída, com cerca de30 paradas em cidades e povoados. O número varia de acordo com cada guia ou mapa, mas depende, sobretudo, da condição física e do interesse do peregrino em prolongar sua estadia.

Caminho aragonês

Divulgação
Castelo de Javier, em Navarra, preserva suas muralhas do século 10

O Caminho Aragonês, com cerca de mil quilômetros, é o segundo mais procurado pelos peregrinos. Ele começa em Somport, nos Pirineus, a 1.600 metros de altitude, e segue margeando o Rio Aragón. Aliás, o rio raso e com largas margens será o fiel companheiro do peregrino.

O itinerário percorre montanhas, bosques, pradarias, campos áridos e antigas fortificações. As ruínas de povoados antigos e até abandonados dão um toque de isolamento. As distâncias entre as seis paradas é maior do que no Caminho Francês, obrigando o peregrino a estabelecer um bom planejamento.

Vale a pena fazer um pequeno desvio da rota e seguir até o Castelo de Javier, próximo à Sangüesa. Depois de mais de dez séculos de sua construção, suas muralhas continuam praticamente intactas. Ali nasceu São Francisco Xavier que, juntamente com Santo Ignacio de Loyola, fundou a Companhia de Jesus, a ordem dos jesuítas. Em março, uma multidão participa da javierada, romaria em direção ao castelo, que atualmente abriga um museu.

Cerca de 200 quilômetros após o início, o Caminho Aragonês se une ao Francês na cidade de Puente La Reina, e ambos se tornam um só até Compostela.

Via de la Plata

Getty Images
A alta torre construída pelos mouros permanece de pé na Catedral de Sevilla

Com mais de mil quilômetros, a Via de la Plata é a mais longa, cruzando a Espanha de norte a sul. Chamada de “a coluna vertebral da Ibéria”, metade do caminho segue o mesmo itinerário da estrada romana, construída no século 2 antes de Cristo. Chama a atenção como alguns trechos ainda conservam o pavimento original e os milários, colunas de concreto de dois metros de altura que faziam referência ao poder do Império.

A Via de la Plata pode se unir ao Caminho Francês em Astorga, ou aoCaminho Português em Ourense. De qualquer forma, essa é a rota com maior número de tesouros culturais e históricos.

O ponto de partida é a Catedral de Sevilha, considerada patrimônio da humanidade pela Unesco. Construída sobre uma antiga mesquita, o templo preservou a Giralda, uma alta torre de arquitetura mourisca. Aliás, a influência moura ainda está presente em outras cidades do trajeto como Salamanca e Granada.

Caminho do Norte ou Litorâneo

José Antonio Gil Menezes/Flickr
O Caminho do Norte segue paralelo ao Mar Cantábrico

Acompanhando o traçado do Mar Cantábrico, no norte da Espanha, o caminho percorre trechos verdes de montanhas, belas praias e aldeias de pescadores. O trajeto começa na Ponte do Rio Santiago, em Irún, no litoral do País Basco, atravessa as regiões praianas da Cantábria e Astúrias, e se envereda pelo interior da Galícia, em um percurso de cerca de 800 quilômetros.

Essa é a rota mais antiga. Na Idade Média, os peregrinos do norte da Europa desembarcavam em vários pontos do litoral norte espanhol para dar início ao percurso a pé até Santiago. São Francisco de Assis trilhou esse caminho em 1214.

Reserve um dia para conhecer o rico acervo de monumentos medievais de San Vicente de Barquera, como a Igreja de Santa Maria dos Anjos e o Convento de São Luis. Construído no século 8, o Castelo do Rei permanece imponente com suas altas muralhas, que serviam de proteção contra o ataque de normandos e vikings.


Caminho Português

Socpunk/Flickr
Detalhe da estátua da Virgem Peregrina, padroeira da rota portuguesa

O Caminho Português reúne dois itinerários diferentes, a rota central e a do interior, mas ambos cruzam Portugal de um extremo ao outro. Margeando o litoral, a rota central pode começar em Lisboa (cerca de 600 quilômetros) ou no Porto (230 quilômetros) – esta última é a preferida pelos peregrinos. Ela chega ao território espanhol pela Galícia.

A fortaleza de Valença marca o fim do território português e início do Caminho por terras espanholas. Seja qual for o trajeto escolhido, você vai passar pela cidade de Pontevedra, que merece uma demorada visita. Ela reúne um dos mais belos conjuntos históricos e artísticos da Galícia, como a Igreja da Virgem Peregrina, padroeira do Caminho Português.

Segundo a tradição, ela teria guiado alguns peregrinos perdidos até Santiago. Em seu interior, tudo faz referência ao Caminho. O formato do templo é inspirado em uma concha, símbolo dos andarilhos. E a fonte de água benta é uma enorme concha encontrada no Oceano Atlântico. 

Caminho inglês

José Antonio Gil Martinez/Flickr
Fachada assimétrica da Igreja Santa Maria dos Azougues, em Betanzos

Durante quatro séculos, o Caminho Inglês era o preferido dos peregrinos que vinham do norte da Europa. A rota foi usada, sobretudo, pelos britânicos durante a Guerra dos Cem Anos entre França e Inglaterra, nos séculos 15 e 16. Eles chegavam por mar até a região da Galícia, de onde seguiam a pé até Santiago.

O auge da peregrinação inglesa foi o Ano Santo de 1433, quando cerca de três mil peregrinos desembarcaram em La Coruña. Um século mais tarde, porém, o rei Henrique VIII se divorciou de Catarina de Aragão e rompeu com a Igreja Católica, o que colocou fim à peregrinação inglesa.

Há dois pontos de partida em solo espanhol: Ferrol, distante 110 quilômetros de Compostela, e La Coruña, a apenas 75 quilômetros. As duas rotas se encontram próximo a um vilarejo de Bruma. Faça um pit stop na simpática cidadezinha de Betanzos. Merecem destaque as igrejas medievais Santa Maria do Azougue, com sua fachada assimétrica, e a de São Francisco, considerada monumento nacional da Espanha. 


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